“We Are the World” de baixo para cima

Quem tem mais de 30 anos deve se lembrar do “We are the world“. Foi um megaprojeto feito em 1985 para a arrecadação de donativos para o combate à fome na África. O projeto ficou conhecido pela gravação de um single, uma canção-tema que tinha como compositores Michael Jackson e Lionel Richie. A gravação da música reuniu alguns dos mais importantes nomes da música pop americana.

O clipe da canção foi transmitido sem parar em canais de TV.

Entretanto, existia mais do que música, celebridades e arrecadação de donativos em “We are the world”. O projeto tornou-se um símbolo da mídia de massa, do quanto ela pode ser eficiente em criar conhecimento em torno de uma causa.

Vinte e sete anos depois, a dinâmica do projeto está presente no digital, mas de uma outra forma, feita de baixo para cima e sem a participação de celebridades.

O Harry Potter Alliance é um exemplo deste tipo de movimento.

Apoiado no uso de mídias 100% digitais – fóruns de discussão, vlogs e blogs -, o movimento realiza eventos online e offline para arrecadação de donativos, mobilização e mudança de atitudes em torno de assuntos polêmicos, como direitos de imigrantes e casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Em 2010, após o terremoto no Haiti, o movimento conseguiu arrecadar uma quantidade de mantimentos suficiente para encher 5 aviões. No último mês, fez com que mil jovens se registrassem para votar nas eleições presidenciais americanas.

Na edição de domingo, o jornal Boston Globe traçou um perfil do movimento, formado por jovens com diversos históricos de vida, mas que têm em comum a atração pela história e pelos personagens da série de livros de Harry Potter.

Criado em 2005 por um fã da série, o Alliance tenta aplicar na vida real o senso de justiça social que existe nas histórias de Potter.

A intenção é reverter toda a energia e a capacidade de mobilização dos fãs em algo maior e que realmente afete a vida das pessoas.

É um movimento fortemente ancorado no digital e que funciona de baixo para cima, sem a necessidade do endosso de celebridades ou músicos famosos.

Esse tipo de “participação cívica” cai como uma luva para os americanos, pois junta duas características bem fortes na cultura americana – a filantropia (é meio comum executivos mais jovens se dedicarem a causas sociais) e a valorização da livre iniciativa (no caso, no setor de mídia – blogs, videologs, podcasts).

Acredito que o Harry Potter Alliance seja um bom reflexo dos tempos atuais. É uma forma de participação cívica com base na disseminação viral de ideias e na criação de um movimento que funciona quase como uma marca ou franquia.

Trabalha com a ideia consagrada de que a chamada mídia de massa é competente em criar conhecimento sobre uma ideia. Mas atesta que, na hora de desenvolver mudança de hábitos, as rotuladas mídias sociais – blogs, podcasts, comunidades online – são bem mais eficientes.

Ademais, reforça o pensamento de que ler um livro de Harry Potter é somente o início da experiência. Hoje em dia, o consumo de um conteúdo (seja um livro, filme ou música) deixou de ser apenas o ponto de chegada. É o início da experiência.

Grandes projetos de mobilização, como “We are the world” ou “Live 8“, sempre existirão, mas o Harry Potter Alliance mostra que outras iniciativas, de baixo para cima, também são viáveis. Às vezes, você pode ser político sem nem perceber.

Uma resposta para ““We Are the World” de baixo para cima”.

  1. Eu gostei do texto. O engajamento social de jovens tem acontecido mesmo de diversas formas. São arbitrárias as falas sobre a apatia dos jovens. Acontece que eles estão em outras plataformas. Parabéns ao Aliance.

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