Tim Berners-Lee acionou o alarme de incêndio

Tim Berners-Lee acionou um alarme.

Segundo ele, o caráter democrático e aberto da internet está ameaçado.

Em artigo na revista Scientific American, o criador da web alerta que empresas estariam, cada vez mais, desenvolvendo “produtos fechados” e “ilhas de informação” (aplicativos e plataformas de redes sociais); governos autoritários, por sua vez, monitorando e restringindo o uso da internet, e provedores de internet, ameaçando favorecer ou desfavorecer um site.

A internet estaria ficando mais fragmentada e menos universal.

Em diversos pontos, o artigo de Berners-Lee pode soar um pouco alarmista para alguns. Constantes pesquisas mostram que as pessoas ainda preferem acessar o conteúdo por meio de navegadores. Além disso, o conteúdo dos aplicativos pode até estar “fora da web”, mas não é exclusivo. Na maioria das vezes, é sincronizado ou replicado da web.

Para entender melhor a repercussão do alerta de Berners-Lee, é necessário saber em que contexto foi publicado o artigo.

O artigo não soa como uma resposta à matéria da Wired sobre o fim da web (assunto que, diga-se de passagem, já está superado com a resposta da Technology Review), mas sim a uma recente declaração de Ed Vaizey, ministro da cultura do Reino Unido.

Berners-Lee é britânico. Mora na Inglaterra. Tem o título de Sir. Há uma semana, Vaizey se posicionou a favor de que provedores de internet locais discriminem certos conteúdos, o que vai totalmente contra a ideia de neutralidade da internet, defendida por Berners-Lee.

O conceito de neutralidade da internet parte do pressuposto de que todos conteúdos e serviços web devem ser tratados iguais. Um provedor de internet (operadora de telecom, empresa de TV a cabo), por exemplo, deve ser neutro, não pode favorecer ou desfavorecer um site ou um tipo de serviço (um site de vídeos abrir mais rápido que os dos seus concorrentes).

Na segunda-feira, quando o artigo de Berners-Lee foi publicado, rapidamente o político se retratou, chegando a concordar com o criador da web.

Esse debate sobre se a internet está perdendo ou não o seu caráter universal lembra uma teoria que Tim Wu, professor da Universidade da Columbia e um dos principais pesquisadores da internet, comenta em seu recente livro The Master Switch.

Segundo Wu, a internet não é a primeira tecnologia que as pessoas acham ser capaz de mudar tudo para melhor. Sempre quando uma tecnologia surge é comum que, no início, ela seja repleta de teorias otimistas, de profecias positivas e quase utópicas. Normalmente, no início, essas teorias funcionam como uma eficiente ferramenta para vender uma tecnologia.

Ou seja, existe uma sucessão de tecnologias que começaram carregando um caráter otimista e aberto e depois se tornaram sistemas controlados por 3 ou 4 empresas.

Com o surgimento do rádio, acreditava-se que o mundo se tornaria uma “grande mente”, pois todos estariam conectados. Não haveria mais monopólios.

Enfim, segundo Wu, essa oscilação entre aberto e fechado sempre aconteceu com plataformas de comunicação e de distribuição de conteúdo. Historicamente, é algo comum.

E, com a internet, talvez estivesse acontecendo o mesmo. Ela estaria entrando no mesmo ciclo.

Ou, possivelmente não. Na realidade, a internet seria a primeira a abolir esse tipo de ciclo.

Seria eternamente “aberta e democrática”.

Veja também: Por uma internet mais humana

Crédito das fotos: Silvio Tanaka e Linder

13 respostas para “Tim Berners-Lee acionou o alarme de incêndio”.

  1. Tudo no mundo passara para um sistema associativo de cada coisa passando para uma matriz das matrizes associando todas as coisas existentes como se fosse uma coisa só

    A matriz de tudo ficando mais livre comprimindo compactando ao máximo com filtra-mento de excelência

    Seremos-nos corrigidos pelas futuras maquinas de acesso, sem mouse sem teclado trocados pela comunicação e o dialogo entre-nos e as maquinas que serão os aparelhos da ficção que deixaram a gente frente a frente sem sair do lugar como se estivéssemos em todos ao mesmo tempo

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    1. Paulo, o seu comentário veio repetido. Acabei retirando um.

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  2. Creio que o caráter mais revolucionário da internet seja de fato dar aos usuários a capacidade de criar publicar o próprio conteúdo. O que aconteceu no rádio é que por uma questão de organização, nem todo mundo poderia ter sua própria rádio pois os canais são limitados. Hoje a internet superou este gargalo com os novos IPs. Diferentemente do rádio, na net qualquer pode realmente produzir conteúdo, criar uma rede, postar um blog ou site. Embora existam grandes infraestruturas para isso como o Blogger e WordPress, que são parte de empresas, ou no caso das redes sociais que são uma ou outra dominando. De fato na internet sempre existirá a possibilidade de que se uma rede ou site ou conteúdo se torna fechado, você simplesmente muda para outro ou cria o seu. O único ponto fraco da rede, assim como foi no rádio, é a infraestrutura: Até quando qualquer um pode ter seu próprio domínio?

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  3. Avatar de runmotherfuckerrun
    runmotherfuckerrun

    taí, não sabia desse contexto. e interessante o argumento do Tim Wu. Não conhecia esse cara. abs

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    1. O livro dele – The Master Switch – é bem interessante. Em breve, comento no blog.

      abs

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  4. Legal saber deste real contexto. Toda a repercussão deste artigo do Berners-Lee, que li na web brasileira, o deixava de lado e apenas apontava a ideia de que o autor estava se posicionando contra as plataformas de redes sociais conectadas (e o seu caráter de dados fechados). Mas na verdade, a ideia do Berners-Lee vai bem além disso. Parabéns pelo post!

    Ainda teremos muito o que discutir e refletir sobre a neutralidade da internet e os seus possíveis efeitos. Tenho certeza que esta história será longa! Contudo, pessoalmente, torço para que a Internet possa romper este paradigma descrito por Wu e se consolide cada vez mais aberta e democrática.

    abs

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  5. A web se resume em uma palavra: compartilhar.
    Você só compartilha com um diálogo. Você fala e ouve. Você lê e comenta. Você assiste e indica. Se você não pode publicar sua opinião, qual a graça? Qual o ponto? E é diferente de antes da "web 2.0" onde não compartilhávamos porque alguém proibia, mas porque não podíamos. Se alguém restringe suas possibilidades de diálogo, essa pessoa não é realmente livre. Vide 1984 do Orwell.

    O que eu quero ver, é a guerra que pode ter entre nós e os bam-bam-bans das empresas interessadas em restringir as possibilidades. Será que a web pode ser controlada sem opressão? Ou melhor, sem ninguém perceber?

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  6. […] Tiago Dória, Boing Boing e Huffington Post. « Busk. Ou “brasileiros botando […]

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  7. […] ou instituições que estão “começaram a deixar de lado seus princípios”.>> Leia maisTiago Dória: Tim Berners-Lee acionou o alarme de incêndioSegundo ele, a internet se tornou poderosa como é hoje porque é aberta e permite que qualquer […]

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  8. sempre desconfiei…cuidado o santo é de barro, ou silìcio…

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  9. […] post do blog do jornalista de cultura digital Tiago Dória, fico sabendo que o britânico Berners-Lee, que manteve-se ao longo dos anos como autoridade […]

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  10. Acho que não dá pra comparar rádio e tv com internet. Nenhum usuário (pelo menos o comum, como eu, sem conhecimento da matéria) pode criar uma emissora de rádio ou tv com aparelhos que apenas captam essas emissões. Mas com um pc qualquer pessoa cria seu próprio veículo de comunicação, e pode fazer de seu pc seu próprio provedor também. Pode-se criar até uma rede doméstica, e isso sem precisar conhecer muito da coisa. E com um pc qualquer um cria inclusive sua própria rádio ou tv. Ora, se algumas empresas 'fecharem' seus conteúdos, como já o fazem com o acesso a conteúdo restrito a usuários pagos, os usuários criam o seu próprio. Uma única pessoa pode criar uma rede de blogs, por exemplo, ou um portal. Inclusive em serviços gratuitos. Acho que o problema que surgiu aí é que a Inglaterra é uma ilha, e quem mora nela tem a tendência de ver tudo a partir dessa ideia! Ou como os estadunidenses, que acham que o país deles cobrem todo o planeta.

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