O que a Google faria se o mundo fosse apenas dela

Terra

Profecias de que a Google vai dominar o mundo existem aos montes. Jeff Jarvis, jornalista, investidor, autor do blog Buzz Machine e professor de Jornalismo da Universidade de Nova York, resolveu levar essas profecias mais a sério e tirá-las do campo apenas do fantástico e das teorias conspiratórias.

Se a Google administrasse um restaurante, como ele seria? Se fosse dona de uma universidade, como seria a educação oferecida? E ainda. E se a empresa de busca fosse um banco, quais investimentos existiriam? Ainda haveria dinheiro em papel? São algumas das perguntas que Jarvis responde em seu livro “O que a Google faria?” (257 páginas), lançado pela editora Manole, no Brasil.

Na realidade, Jarvis mostra como seria o mundo, caso as principais empresas e organizações que fazem parte de nosso cotidiano pensassem como a Google. A Google raciocina como uma plataforma. Esse é o seu diferencial. E, como consequência, uma empresa “googleficada” seria uma que pensasse de modo distribuído e fosse faminta por dados. Soubesse transformar dados sobre os seus clientes em conhecimento. Trabalharia com a abundância e não com a escassez de conteúdo.

Jeff JarvisOs “insights”  de Jarvis (foto ao lado) sobre o que aconteceria se esse modelo fosse aplicado a diversos setores da sociedade são a base do livro.

Como seria a “googleficação” das empresas aéreas? Em nossa viagem de volta, as companhias aéreas pediriam nossas avaliações sobre hotéis e restaurantes que frequentamos. Em troca de nossa avaliação, ganharíamos milhas. Ou seja, as empresas aproveitariam a própria rede de clientes e o seu valor para reunir conhecimento sobre uma região. Transformariam dados em conhecimento.

Governos, por sua vez, não tentariam resolver os problemas por meio de proibição e regulamentação, mas a partir de inovação e “racionalidade científica”. Para exemplificar, Jarvis cita Al Gore, político tradicional, que procura resolver o problema energético por meio da criação de impostos sobre a emissão de carbono. Tenta tornar a poluição cara. Enquanto, a Google, mais inovadora, tenta resolver o problema com o olho em uma sociedade de abundância, em investir em criatividade, buscar novas formas de energia além das tradicionais. Ou seja, ter abundância de fontes de energia.

googleapple01No setor de mídia, Jarvis deita e rola. É a sua área. Numa visão bem realista, diz que os jornais deveriam pensar como plataformas, o que necessariamente não significa liberar o acesso público a APIs ou a banco de dados. Significa ver o seu site como um meio e não um fim. Uma plataforma para as pessoas chegarem onde quiserem. Nisso, uma política presente de links abertos é um caminho.

Somente o capítulo “Nova arquitetura”, em que Jarvis aborda o setor de mídia, já vale pelo livro inteiro, que pretende ser um guia de sobrevivência para empresas na “Era Google”.

A meu ver, o problema de Jarvis é que ele adota uma postura muito evangelista, ativista, e pouco científica em relação ao assunto. Apesar de existirem empresas que têm uma postura mais controladora e, mesmo assim, vão muito bem da vida, até o final do livro, ele quer nos convencer de que o modelo da Google é o caminho ideal, pode ser aplicado a praticamente qualquer negócio. Desde uma loja de vinhos até um governo federal. E é, nesses momentos, quando ele sai da análise do setor de mídia, que fica evidente o seu conhecimento meio simplista a respeito de algumas áreas.

googlefariaNo penúltimo capítulo, por exemplo, quando divaga sobre a área jurídica, ele afirma que todos os processos judiciais deveriam estar disponíveis na web,  serem buscáveis, disponíveis para qualquer pessoa. Ou seja, Jarvis ignora que existe o direito ao “segredo de justiça”. Existem processos que, por motivos diversos, como envolvimento de crianças ou casos de família, não devem ser acessíveis a qualquer pessoa. Assim como o acesso livre a dados, a privacidade também é liberdade.

Percebe-se que essa postura ativista ofusca a análise de Jarvis quando afirma que a Google está acabando com a intermediação. No começo do capítulo sobre “desintermediação”, ele bate o martelo – “Ninguém gosta de intermediários”.

Contudo, Jarvis se esquece que o próprio Google está se tornando um grande intermediário, um mediador entre a gente e todo o caos de conteúdo da web. A intermediação não acabou.  O Google é um intermediador. É ele quem faz o meio de campo na web.

Em “O que a Google faria?“, Jarvis mostra que é um dos poucos escritores que consegue transformar profecias em conhecimento ao montar um guia sobre como a Google faz.

Veja também:
Na verdade, somos viciados em eletricidade

Crédito das fotos: NASA, Robert Scoble, Missha, divulgação

15 respostas para “O que a Google faria se o mundo fosse apenas dela”.

  1. Assunto muito interessante Tiago, parabéns pelo artigo. Abraço!

    Curtir

    1. @Ricardo Pereira

      Olá Ricardo, tudo bem? Obrigado! Abs

      Curtir

  2. Olá Tiago,
    Como de costume, excelente visão crítica.
    Só senti falta de algo a mais sobre o ponto forte segundo você, o capítulo Nova Arquitetura. Propositalmente ou não, você deixou só o gostinho. rs

    abraços

    Curtir

    1. @Leandro Cianconi

      Obrigado, Leandro. É verdade… rs, poderia ter falado mais. Mas basicamente, Jarvis fala sobre essa questão dos sites de mídia serem uma plataforma e não um destino final. Outra coisa que ele bate na tecla é sobre a importância de um site buscar a sua identidade e se focar no que sabe fazer melhor. Os jornais trabalham com publicação (papel) ou informação/conhecimento?, ele pergunta em um capítulo.

      abs

      Curtir

  3. Fiquei faminto pelo livro apesar de também discordar do autor, quanto aos intermediários. Os clientes gostam de intermediários que fazem a experiência mais agradável e é exatamente o que a Google faz.

    Sem dúvida, o modelo de negócio da Google é invejável. Na minha empresa, sempre pensei o que a Google faria, mas como não é a Google, não é tão fácil incorporar, algumas coisas sim. 🙂

    Curtir

  4. Legal Tiago,

    Está anotado na lista. Pode ser que saia qualquer dia. 🙂
    Obrigado pelo retorno.

    Abraços.

    Curtir

  5. […] » O que a Google faria se o mundo fosse apenas dela Após a sua avaliação, vote ou comente Fonte Profecias de que a Google vai dominar o mundo existem aos montes. Jeff Jarvis, jornalista, […]

    Curtir

  6. Tem como mandar este livro de presente pra mim não?! huAUAaUHauh. Também fiquei na vontade pra ler este livro.

    Saber como o Google seria tomando conta de todas esta instituições é sempre muito bem vindo.

    Vou comprar!

    Curtir

  7. […] Em tempo: estou lendo no momento o livro O que a Google faria?, de Jeff Jarvis. O jornalista Tiago Doria escreveu uma bela resenha sobre o livro. […]

    Curtir

  8. Excelente post. Parabéns
    .
    Apenas um comentário sobre a visão simplista em relação a outras áreas.
    Quando você diz que o Google é um intermediário entre as pessoas e o caos da internet, isso na verdade também é uma visão equivocada de como é a internet. Na verdade ela está longe de ser um caos. Trata-se de uma rede complexa que tem uma distribuição de conexões bem definida. Não acho que seja a Google um intermediário nesse caso. Ela apenas conhece a estrutura dessa rede e usa isso como serviço para as pessoas. Porém, esse conhecimento é fruto de pesquisa de diversos grupos de sistemas complexos no mundo inteiro e publicado em várias revistas de pesquisas. Ou seja, um conhecimento de todos. Nem todas as pessoas são obrigadas a saber sobre tudo, ou fazer tudo. É para isso que existem as prestadoras de serviços. Porém, não é privilégio da Google o conhecimento sobre a internet.

    Mais uma vez parabéns pelo post.

    []s

    Curtir

  9. […] Jarvis, jornalista e autor de O que a Google Faria?, contra a ideia de governos subsidiarem empresas de jornalismo em crise. Segundo ele, o futuro […]

    Curtir

  10. Imperdivel esse livr, é uma chamada para acordar para novos tempos

    Curtir

  11. […] suas universidades, hospitais, companhias aéreas e de energia? Um capítulo pra cada. Um post do Tiago Dória em seu blog fala um pouco mais sobre essa parte. Devo assumir que encontramos muita utopia nas colocações de […]

    Curtir

  12. Avatar de Ana Carolina Ferraz
    Ana Carolina Ferraz

    Tiago, parabéns pelo comentário sobre “O que a Google faria?”. Concordo com você, principalmente, que Jarvis foi infeliz no penúltimo capítulo, quando fala sobre as “exceções”. Me surpreende como um profissional de Comunicação como ele, se limita ao conhecimento sobre a especialidade de Relações Públicas…

    Curtir

Deixe uma resposta para Aracele Torres (araceletorres) ‘s status on Tuesday, 08-Sep-09 18:47:07 UTC – Identi.ca Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados *