Histórias escondidas nas buscas

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Logo após o 11 de setembro, houve um aumento das buscas pelo termo “alianças de noivado”. Após os ataques, os EUA entraram em uma fase de instrospecção e as pessoas passaram a querer estar mais próximas àquelas que mais amavam.

No mês de janeiro, os termos mais buscados são “como parar de fumar”, “como emagrecer” e é justamente no primeiro mês do ano que, tradicionalmente, firmamos promessas pessoais para o ano inteiro. As visitas a sites de pornografia e buscas por termos relacionados têm uma queda no domingo, provavelmente por que as casas estão lotadas de parentes ou toda a família está presente em casa.

Esses exemplos são utilizados por Bill Tancer, autor do livro Click (309 páginas), recém-lançado pela Editora Globo, para mostrar o quanto os termos que pesquisamos nos sistemas de buscas dizem muito sobre nós, a respeito do nosso comportamento e personalidade.

Em 2005, o jornalista John Battelle, em seu livro A Busca, já dizia que o registro de buscas era um “grande banco de dados de intenções da humanidade”.

O que Tancer, colunista da revista TIME e diretor-geral da empresa de pesquisa Hitwise, faz no livro Click é explorar ao máximo esse conceito – de que as buscas que fazemos na internet refletem muito de nós. Aliás são na maioria das vezes o melhor jeito de verificar os gostos e as preferências das pessoas em uma determinada época, ou seja, explorando os dados, os rastros que deixamos na rede.

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Segundo Tancer, quando estamos na frente do computador e com a sensação de um suposto anonimato, acabamos nos soltando mais do que na frente de um representante de um instituto de pesquisa. Isso faz com que a análise dos dados de nossas buscas seja mais eficiente para tomadas de decisão e revele tendências que antes não eram tão visíveis.

Por métodos tradicionais de pesquisa, por telefone ou pessoalmente, dificilmente pesquisadores saberiam que as maiores dúvidas que as pessoas têm é “como dar o nó na gravata” ou “como fazer sexo”. Ou que os maiores medos pessoais são o de “ficar sozinho a vida inteira” ou o de “firmar um compromisso muito forte”. Todas as quatro estão entre as expressões mais buscadas na rede.

Tancer também mostra o quanto as outras mídias, a TV principalmente, pautam o que a gente busca na rede. Por exemplo, logo após o anúncio num capítulo da série Gene Simmons: family jewels, do canal de TV A&E, de que o vídeo da cirurgia facial de Simmons, músico do Kiss, estaria na internet, choveram pessoas buscando pela gravação no site da emissora. Reflexo da chamada na TV (produtos e pessoas citadas na TV normalmente são as mais buscadas na rede).

Durante a leitura do livro, fiquei pensando se esses dados sobre o que buscamos na rede também pudessem ser utilizados no jornalismo, no dia-a-dia para pautar a edição. Ao invés da “concorrência fez isso”, “o assessor de imprensa me mandou tal release” ou o “editor viu um negócio interessante não sei onde”, uma reunião de pauta também poderia ser guiada por esses dados. Uma crescente busca por um termo pode indicar o interesse do público por um determinado assunto, que vale a pena investir na cobertura.

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O que eu senti falta foi de uma postura mais crítica de Tancer em relação a precisão e até o quanto esses dados de buscas na internet refletem realmente o nosso comportamento. Além disso, há a questão da privacidade, algo que vem preocupando muitas agências reguladoras, principalmente na Europa. As pessoas sabem que, ao usar um sistema de busca, o seu comportamento será analisado e utilizado, mesmo que de forma anônima, por empresas?

Essas questões ficam de lado. O que o escritor faz, de certa forma, é vender seu peixe (Tancer é diretor-geral da Hitwise). Mostrar o quanto esses dados são importantes para a tomada de decisões e o quanto eles podem revelar nuances de comportamento que não são detectadas em métodos tradicionais de pesquisas.

Somente em um momento Tancer questiona – se o fato de usarmos cada vez mais as ferramentas de busca como um divã, ao invés de perguntarmos a um amigo, não estaria a internet, na verdade, nos isolando.

Mesmo com essas questões em aberto o livro não perde a sua importância.

Talvez, no futuro, quando alguém quiser saber como foi um período da humanidade, depois do surgimento dos sistemas online de busca, a melhor forma não será tanto visitar arquivos de museus ou bibliotecas, mas sim analisar os dados de registro (log) de diversas buscas feitas na internet.

Junto com o A Busca, de John Battelle, acredito que Click seja atualmente um dos melhores livros para quem quiser entender por que aquele novo ditado de que “nós somos aquilo em que clicamos, nós somos o que pesquisamos no Google” faz tanto sentido.

Crédito das fotos: Transcam, DullHunk e reprodução de capa

Veja também:
Em 2009, “O culto do amador” não fede nem cheira

23 respostas para “Histórias escondidas nas buscas”.

  1. Adorei o post. Vi seu blog como indicação no do Marcelo Tas e vim aqui dar uma olhada! Realmente é muito bom! Passarei a vir aqui com uma maior frequência! Como estudante de Jornalismo, adorei a ligação que faz sobre as pesquisas da net e as reuniões de pauta do jornal! Muito bom mesmo!!

    Bejos
    Até a próxima!

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    1. @Manoela

      Obrigado, seja bem vinda ao blog!

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  2. Já observei isso, realmente o que clicamos varios véiculos de televisão
    clica tbm.Muito bom, é sinal que estão atentos as mudanças.

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  3. A questão da privacidade é realmente mt preocupante. Como vc falou, a falsa sensação de anonimato faz as pessoas confiarem mt na internet, sem saber q realmente mts pessoas podem ter acesso às suas informações pessoais…

    Abç

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  4. São coisas sensacionais que as tecnologias possibilitam, se não fossem os caretas e ditadores de plantão sempre buscando o controle…
    Talvez com programas organizadores de rastros de busca, entremos numa fase de ” perfis de busca”, simplesmente pela superposição dos diversos trechos de informação procurada, emaranhada e até aonde foi aprofundada. Adeus perfis tipicos de RH.

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  5. Ótimo post…. não se vem neste blogue e se sai de mãos vazias!

    A internet a cada dia se torna um elemento fundamental cultural e socialmente… Mas ainda não atentamos para algumas consequencias ou mesmo aspectos como a infra-estrutura da rede, que é toda privada, me parece…

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  6. A invasão de privacidade é dramática, mas ao mesmo tempo poderá ser, para a humanidade, um caminho para quebrar hipocrisias, e preconceitos. Isto porque o ser humano irá descobrir que os desejos de seu vizinho não são lá muito diferentes dos seus, em todos os aspectos.

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  7. maravilhosa materia, realmente incentiva a introspecção e ao uso consciente da massa cinzenta ao surfar na web…
    parabéns Tiago, seu blog é um ótimo formador de opiniões!

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    1. Obrigado, Wal!

      Abs

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  8. Muito interessante!

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  9. […] Veja também: Histórias escondidas nas buscas […]

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  10. […] às dúvidas existenciais e até mais banais. Aspecto comportamental que é bem abordado no livro Click, de Bill Tancer, e que já ganhou uma resenha aqui, no […]

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  11. […] portanto, faz parte de uma série de livros que está saindo no mercado brasileiro sobre o tema. Click, de Bill Tancer, foi o primeiro, lançado no começo deste ano. Numerati é o mais […]

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  12. […] e deixa muitas questões em aberto, mas ratifica bem que o Google vem sendo utilizado como um grande oráculo, mesmo quando se trata de buscar por notícias e análises. Não é somente para responder […]

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  13. […] o último do HSM ExpoManagement 2009. Um dos palestrantes será Bill Tencer, autor do livro Click, que comentei aqui, no blog, no começo do […]

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  14. […] palestra no HSM ExpoManagement 2009 teve como base o seu livro Click, no qual ele mostra o quanto os termos que pesquisamos nos sistemas de buscas dizem sobre nós, a […]

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  15. […] disso, a matéria cita algo que Bill Tancer analisa muito bem em seu livro Click. Sobre o quanto a TV pauta o que discutimos e buscamos na […]

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  16. […] seu livro Click, Bill Tancer, diretor de pesquisa da Hitwise, bate na tecla de que, atualmente, os sistemas de […]

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