Como são os melhores jornais do mundo

Atendendo a pedidos, vou voltar a escrever posts sobre dicas de livros aqui, no blog. Até criei a categoria livros.

Volto com o Os Melhores Jornais do Mundo, de Matías Molina, um livro com 680 páginas e publicado pela Editora Globo, importantíssimo para quem quer entender tudo o que está acontecendo na área de imprensa atualmente.

Molina, jornalista, historiador pela USP e colaborador do Valor Econômico, faz um histórico dos mais influentes jornais do mundo.

Da leitura, tirei algumas curiosidades e conclusões interessantes.

São várias, mas separei, não necessariamente na ordem de relevância, algumas para vocês terem uma melhor noção da importância do livro:


The Wall Street Journal de cara nova: De biquíni, mas com MBA

Curiosidades:

1) A maior redação do mundo é a do jornal japonês Asahi Shimbun. São 2.700 pessoas, sendo que 1.200 são jornalistas. Próximo ao jornal, existe um prédio-dormitório onde ficam 300 repórteres, prontos para qualquer imprevisto. Igual ao Corpo de Bombeiros. Dormem no quartel.

São 12 milhões de exemplares por dia. É o 2º maior jornal do mundo – o 1º é o Yomiuri Shimbun, com 14 milhões.

2) Durante um período, cada repórter do alemão FAZ tinha direito a um carro, um Golf. Aos editores uma BMW disponível 24 horas para cada um. É lógico que essa abundância não durou muito.

3) Conhecido por dar um viés sensacionalista aos produtos, quando Rupert Murdoch comprou o sisudo e respeitado The Wall Street Journal no ano passado, foi questionado se ele colocaria fotos de mulheres de biquíni, com pouca roupa nas páginas do jornal.

Murdoch diz que colocaria, mas que todos poderiam ficar tranquilos, pois elas teriam MBA.


Redações: união de impresso e internet é tendência

Conclusões:
1) Influência e relevância não estão ligadas a números. A história dos jornais mostra isso a todo o momento, mas é mais evidente nos EUA. Para se ter uma idéia, o USAToday é jornal de maior circulação nos EUA, seguido do Wall Street Journal e do The New York Times.

São números, mas quem pauta a imprensa local e do mundo inteiro, inclusive a internet?  The New York Times, que é o 3º e tem uma circulação bem menor.

2) A internet é um desafio, mas não é o principal motivo da crise de alguns jornais. Aliás, em parte, essa crise é recente. Jornais sempre trabalharam com margens de lucro muito baixas – 1 a 3%.

Os donos de jornais bem sucedidos são aqueles que trabalham com essa margem e sempre viram os jornais não como uma forma de ganhar dinheiro, mas de ganhar influência, mesmo sem interferir na parte editorial.

Mas voltando a essa crise, ela é resultado de anos de má administração – contratações e promoções baseadas mais em critérios pessoais do que técnicos, falta de estudos corretos de mercado, falta de investimento em pesquisa na criação de novos produtos etc.

Enfim, aspectos que a longo prazo minam qualquer negócio.

3) O posicionamento mais bem sucedido tem sido o semelhante ao do ElPais. O site é utilizado para atingir um público global, nunca antes trabalhado pelo jornal. Um mercado natural, maior e além das fronteiras.

E o impresso focado cada vez mais nas questões locais. Até por que o impresso tem um problema de distribuição, não pode estar acessível de qualquer lugar do mundo. O site, ao contrário, pode.

Impresso = mais local/ Site = público global, trabalha com o conceito de informação disponível de qualquer lugar. Um dos desafios é migrar a publicidade a esse mercado global e online.


The New York Times como trendsetter no mercado de jornais

No geral, Molina deixa de fora muita coisa sobre a internet. Isso é bom e ruim. Bom porque ele tem mais espaço e energia para falar sobre um passado que você não encontra muito material em português por aí.

E ruim porque essa parte da internet nos jornais é essencial para entender qual visão eles têm sobre o seu futuro. O site reflete muito a missão e a visão do jornal.

Outro aspecto é que Molina não comenta a importante decisão do The New York Times de abertura do  conteúdo de seu site, em setembro de 2007. O livro foi fechado em outubro de 2007. Ou seja dava tempo de ter uma menção ao caso.  O livro merece uma nova edição atualizada daqui a algum tempo.

Apesar disso, Os Melhores Jornais do Mundo é uma obra necessária e que pode ser utilizada como consulta e referência. Ao final de cada capítulo, Molina fornece uma ficha técnica de cada jornal – números de circulação, receita publicitária e endereços de contato – que pode ser consultada a qualquer momento.


Na Espanha, a venda de jornais voltou a subir

Para alguns o livro mostra que o futuro da imprensa é sombrio. Não faço essa leitura. Para mim, é o contrário. Ao mostrar desafios pelos quais a imprensa já passou – guerra mundiais, destruição de redação e lobby de sindicatos [jornais ficaram sem circular por meses] – demonstra que a internet é somente mais um dos desafios para o seu futuro.

NYTimes e ElPais são alguns jornais que estão sabendo se virar nesse mundo. O que ocorre é que as empresas de mídia estão passando por uma fase de autoconhecimento.

Têm que perguntar a si mesmas – qual é o nosso serviço em essência? Sou uma empresa de conteúdo ou de tecnologias que ajudam a organizar e a entender toda essa avalanche de informação que está acessível hoje em dia? O que pode ser construído ao nosso redor?

Na verdade, somos um hub que agrega pessoas [comunidade] que estão em busca do mesmo tipo de informação e têm a mesma visão de mundo? Adotar uma postura “agnóstica” de não se prender a formatos não seria o melhor caminho?


O site de um jornal reflete muito a sua visão sobre o seu futuro

Acredito que o NYTimes e o ElPais são dois veículos que já responderam a essas perguntas e seguem influenciando o mercado de informação e colhendo frutos positivos.

Antes de tudo, são empresas de conteúdo que caminham para funcionar independentemente do formato em que se apóiam – impresso, internet, TV etc.

Existe uma frase do editor do ElPais, Javier Moreno, citada no livro que resume um pouco essa idéia. “Um jornal não é o papel; são seus jornalistas, seus fotógrafos, seus editorialistas e seus valores. Em resumo, a sua maneira de ver as coisas, compartilhada com os seus leitores”.

Por isso, acredito que a imprensa tem um futuro brilhante, quando bem administrada.

O próximo livro a ganhar um post será o Universo Elétrico, de David Bodanis. Ele conta de forma “romanceada” a história da eletricidade e as tecnologias que surgiram a partir dela – telégrafo, redes de computadores, telefone. Sem ser técnico, mas também não simplório.

Por exemplo, por meio dele, você descobre que o principal motivo de Graham Bell ter inventado o telefone no sec XIX foi simplesmente conversar e mostrar que era importante para os pais de sua namorada, que era surda.

As fotos do post são de leslie duss e hamed

Post relacionado:
Fim de uma era: The New York Times não é mais um jornal

24 respostas para “Como são os melhores jornais do mundo”.

  1. A Internet resolveu o problema de distribuição de muito jornal.

    Quem no Brasil lia Elmundo, The Telegraph, ElPais?

    Ótimo post!

    Um abração

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  2. Belo post! Eu gosto das suas análises, me parecem sempre muito ponderadas.
    E como viciada assumida em livros e livrarias, adorei saber que aqui vai ter um “ponto” de informação, hehehe…

    Ah! E parabéns pela matéria no Link, não deu pra comentar antes. Essa semana achei interessante que uma amiga, que não costuma se interessar pelo assunto, usou a sua entrevista para fundamentar um ponto de vista…ou seja, as suas idéias entraram na cabeça das pessoas né?

    bjs

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  3. @Flavia

    Muito obrigado!

    Ótimo saber essa história sobre sua amiga. Mais um incentivo. 🙂

    Bjs

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  4. […] Tiago Dória Weblog » Blog Archive » Como são os melhores jornais do mundo Post delicioso do Tiago Dória que trata de um livro sobre os jornais mais importantes do mundo, tendèncias de jornalismo, etc (tags: jornalismo jornais imprensa) […]

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  5. Olá, Tiago!
    Valeu pelo post.
    Abraços.

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  6. Avatar de Leandro Corrêa
    Leandro Corrêa

    resenha de livro o/

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  7. Parabéns, gostei da resenha e pretendo comprar o livro para entender um pouco mais do que se passa no meio impresso.

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  8. Li na revista Folio Magazine, algumas edições atrás, que o NY Times tem 10 vezes mais pessoas lendo o jornal online, do que impresso, porém o ‘online’ dá apenas 1/10 da receita. Mesmo com toda influência que eles têm.

    Como proprietário de um jornal comunitário nos EUA, posso dizer que a transição para o ‘online’ tem dificuldade porque os anunciantes ainda preferem o impresso.

    Como disse o Seth Godin, no livro Meatball Sundae, as empresas ainda estão com a mentalidade de quererem a mídia tradicional.

    Sobre o alcance global do El Pais, surge a questão: Como rentabilizar esse mercado global?

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  9. Muito completa sua abordagem, Tiago. Como estudante de Jornalismo dos anos 80, nunca poderia imaginar este cenário…

    Abs,
    Marcelo

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  10. Obrigado, Marcelo!

    Abraços

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  11. […] certa forma, a NPR respondeu àquela pergunta de autoconhecimento que todo empresa de mídia deveria fazer: O que pode ser construído ao nosso […]

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  18. […] um negócio lucrativo e que, de repente, foi afetado pela internet. Como se antes não existisse uma crescente crise ou perda de lucros. Existem jornais impressos que passaram a vida inteira no vermelho e até hoje não dão lucro, […]

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  20. […] Veja também: Como são os melhores jornais do mundo […]

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