Quando o conhecimento atrapalha e ajuda

Sou meio suspeito para falar de Dorothy Leonard-Barton, pois, até hoje, a pesquisadora é uma das minhas principais referências em palestras e cursos.

Doutora e professora de Gestão do Conhecimento e Inovação na Universidade de Harvard, nos EUA, a pesquisadora é bastante conhecida e citada na área de gestão de tecnologias emergentes.

Os ensinamentos de Leonard-Barton podem ser aplicados a qualquer tipo de organização – grandes e pequenas empresas, Ongs, igrejas, agências de publicidade ou até mesmo a redações de jornal.

Segundo Leonard-Barton, a maioria das organizações quebra por confundir o objetivo do negócio (missão tecnológica) com a tecnologia (plataforma utilizada).

Isso aconteceu recentemente com a indústria musical que não soube diferenciar o objetivo do negócio (fornecer experiência musical) da tecnologia utilizada (CD). O mesmo pode estar acontecendo com alguns protagonistas da indústria de jornal, que, na mudança dos átomos para os bits, não sabem mais se a sua missão é “filtrar, analisar, interpretar informação” ou “fazer jornal de papel”.

Em sua passagem pelo Brasil, nesta semana, como palestrante da HSM ExpoManagement 2011, a pesquisadora falou sobre o quanto o conhecimento pode ser uma faca de dois gumes quando se trata de inovação tecnológica.

Para inovar é necessário ter conhecimento. Grandes inovações surgem da reutilização de conhecimento. Por exemplo, o acelerômetro usado em celulares, como iPhone, pode ser reutilizado para criar “sapatos inteligentes”, que reagiriam a torções e guinadas, algo que seria útil para pessoas idosas.

Contudo, quanto mais conhecimento uma organização tem numa área, menor a probabilidade de conhecer o que “não sabe”. Ou seja, maior o risco de, após anos de excelência, ter dificuldade de mudar.

Isso acontece não somente com organizações, mas com profissionais. Um profissional fica tão especializado e focado em uma determinada área, que depois torna-se difícil de ser contestado ou de ele aprender novos conhecimentos. Alguns pressupostos ficam enraizados.

Na realidade, o conhecimento tem dois lados – dependendo do contexto, pode ajudar e, ao mesmo tempo, restringir a inovação.

Segundo Leonard-Barton, a inovação acontece quando vários conhecimentos se misturam. Empresas e mercados inovadores nascem da união de ecossistemas diferentes.

Exemplo: a Google surgiu da união entre TI e sistemas de informação; a Amazon nasceu a partir da união de marketing e tecnologia.

Apesar dessa mistura ser essencial para inovação, existe um tipo de conhecimento que se sobressai – o conhecimento tácito. É aquele conhecimento pessoal aprendido por meio da experiência prática, do fazer, e que, por isso, é difícil de ser compartilhado e formalizado. Está muito interiorizado nas pessoas.

Quantas vezes você não teve dificuldade de explicar o modo de fazer algo que você realiza todo dia e com eficiência? É bem provável que aí resida conhecimento tácito.

Por ser exclusivo, pessoal e difícil de ser formalizado e transferido, o conhecimento tácito é um dos mais importantes e valiosos que as pessoas e as organizações têm.

Isso explica, em parte, por que muitas empresas não conseguem inovar – historicamente, a inovação tem como base o conhecimento tácito.

Leonard-Barton deu algumas dicas sobre como fazer para que o conhecimento não restrinja a inovação em uma organização. Vale lembrar que as dicas servem para qualquer tipo de organização – agências, jornais, igrejas…

1) Sempre desafie e conteste os experts de sua empresa (os especialistas podem estar errados).
2) Crie grupos de trabalho e de estudo com conhecimentos e experiências diferentes (a ideia é criar atritos mesmo, divergências intelectuais. É aí que surge a inovação).
3) Traga um “alien” para os grupos da organização – um profissional com conhecimento e experiência totalmente diferentes do resto da organização.
4) Incentive a transferência de conhecimento tácito (A IDEO fez um programa no qual treinava profissionais da Samsung)
5) Recorra ao crowdsourcing (criar um concurso para o desenvolvimento de aplicativos ou novos recursos para um site é uma ótima forma de buscar soluções na “multidão”).
6) Lance protótipos (Eles nada têm a ver com hardware ou coisas físicas. Protótipos ajudam a criar conhecimento. Têm baixo custo. Um protótipo vale mais do que mil palpites e discussões teóricas sobre se algo é viável ou não).

Veja também: Hans Donner + Freakonomics: 1º dia do HSM Management

Uma resposta para “Quando o conhecimento atrapalha e ajuda”.

  1. […] cuidado é não confundir tecnologia com missão tecnológica. O fracasso de MyGeneration, primeiro seriado na TV americana a utilizar um aplicativo de segunda […]

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