Minha opinião sobre a Declaração de Hamburgo

Vestido de jornal

No Twitter, algumas pessoas estão pedindo a minha opinião sobre a Declaração de Hamburgo, que foi ratificada por alguns jornais brasileiros em reunião da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa), neste final de semana.

Estadão, O Globo e Folha de S. Paulo declararam apoio ao documento.

A aplicação da Declaração é pertinente, pois pode afetar quem usa agregadores de conteúdo (Google e Yahoo News). Ou seja, parte dos leitores deste blog.

Antes de tudo, vale deixar claro que achei positivo o encontro da SIP, por reafirmar que o jornalismo de qualidade custa caro e por trazer à tona os crescentes ataques contra a imprensa na região (vide Venezuela, mais novo integrante da lista de países que agridem a liberdade de expressão).

A questão polêmica está na Declaração de Hamburgo, criada em julho e que afirma que a internet é uma grande oportunidade para o jornalismo. Porém, assume posicionamento contrário aos agregadores de conteúdo. Neste sentido, o documento levanta a questão de propriedade intelectual.

Apesar de redirecionarem tráfego para os sites de notícias, esses agregadores deveriam também compartilhar receita com jornais, segundo foi levantado no encontro da SIP.

Já comentei aqui, no blog, que ir contra o surgimento dos agregadores é como ir contra a lei da gravidade. Os buscadores de notícias fazem parte do processo natural da web.

Google News, Yahoo News, Mahalo são resultado direto da escassez de tempo e da abundância de conteúdo. O principal atrativo desses agregadores é a facilidade, são como filtros. Eles ajudam o leitor a encontrar a informação necessária de forma mais rápida e precisa.

O que eles oferecem, na verdade, não são notícias, mas facilidade, tempo, usabilidade e personalização (dependendo de como você os utiliza).

Se você fechar um agregador, vão surgir outros.

Por outro lado, a Declaração de Hamburgo defende a cobrança por conteúdo, o que não é errado. O problema é sobre o que cobrar. Dificilmente as pessoas vão pagar por algo que é abundante.

O documento e o encontro da SIP ressaltam ainda que o jornalismo de qualidade custa caro, o que eu concordo.

Internet nem sempre é economia. Jornalismo (ou produção de conteúdo) de qualidade tem um custo em qualquer plataforma. Se você quer fazer um jornalismo de qualidade na internet, vai precisar de uma equipe multimídia, bons jornalistas, infografistas, desenvolvedores.

Enfim, quem quer investir para valer no digital vai ter custo.

A Declaração também afirma que acesso livre à web não significa acesso sem custos.

Mas quem falou que tudo é de graça na internet? Alguém sempre paga a conta da internet, seja o conteúdo gratuito subsidiado por publicidade, 5% dos usuários pagantes que pagam os gastos dos 95% não pagantes, serviços gratuitos como isca para vender produtos pagos.

Mesmo num blog gratuito, o leitor paga de forma não monetária ao ceder tempo e atenção para lê-lo. Coisas até hoje escassas e que estão se tornando quase moedas.

Resumindo tudo. Em relação à Declaração de Hamburgo, meu medo é que a indústria de jornais caia no mesmo erro da indústria de música. Trate desafios do presente simplesmente como um problema jurídico, sobre propriedade intelectual. Enquanto que a questão é mais sobre modelos de negócios.

Veja também:
Grandes redirecionadores de tráfego

Crédito da foto: Slyadev

6 respostas para “Minha opinião sobre a Declaração de Hamburgo”.

  1. Xará,

    À primeira vista, a Declaração de Hamburgo me soou meio conservadora, principalmente na atualidade, em que a tentativa de cobrar por material publicado na internet acabe soando como ingenuidade.

    Também concordo em certos pontos, mesmo porque também sou jornalista e defendo que a qualidade dos textos publicados deve ser compensada de alguma forma.

    Mas acho que nem todo conteúdo deveria ser cobrado. Teria que ser algo que realmente valesse a pena,como textos de revistas bem elaboradas, análises bem contundentes e reportagens bem apuradas que despertassem o interesse do internauta.

    Não sei por que, mas algum sexto sentido me diz que Rupert Murdoch de certa forma deve ter influenciado nessa declaração.

    Todos de certa forma querem manter e elevar seus lucros com a internet,principalmente os meios de comunicação,mas tem que pensar muito bem antes de tomar qualquer decisão ou aderir à qualquer causa.

    Boa discussão. Abraços!

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    1. @Tiago Ferreira da Silva

      Sim, Tiago. A fala recente de Murdoch vai ao encontro. Apesar de que eu acredito que os interesses de Murdoch são outros (tentar um possível acordo com o Bing ou a Google).
      Sobre cobrar, não se aplica a todo conteúdo e a todo público. Conteúdo escasso e informação que existe somente por que é restrita faz mais sentido

      Mesmo assim, deve ser algo minucioso.

      abs

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  2. Jornalismo de qualidade custa caro, portanto não está ao alcance do “povão”. Além disso, a julgar pelos orgãos de imprensa apoiadores do tal documento (Estadão, Globo, Folha), dá prá concluir que o que se chama, aqui, de jornalismo de qualidade é aquela parcela da imprensa que faz eco à voz da burguesia intelectualóide reacionária que não aceita ver uma fatia considerável da população sair da condição de miséria para uma melhor situação econômica. Assim, como jornalistas competentes, capacitados, escrevem em sites da internet com acesso barato a qualquer cidadão, o que preocupa o “jornalismo de qualidade” é a queda de faturamento. E tenho dito.

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