Tecnologias para curar a escassez de atenção na mídia impressa

Banca de revista

A mídia impressa talvez seja hoje um dos sacos de pancadas preferidos de pensadores que tentam vender as chamadas novas mídias como a “terra prometida“. Com a vinda do Kindle, então, o discurso contra a mídia impressa ficou mais carregado.

Muitas vezes, esse discurso não vai muito além de um futurismo exacerbado, de análises apressadas e de uma visão que não vê as mídias e a comunicação como processos integrados.

kindle_01Na realidade, o cenário é de mídias convivendo lado a lado. O que existe são intensidades de usos diferentes para as mídias. E o mais importante de tudo, há um ambiente hipercompetitivo – com o crescimento das tecnologias de publicação e edição de conteúdo e da banda larga, o ambiente de mídia ficou mais competitivo. Existe uma abundância grande de conteúdo e informações, o que faz gerar uma escassez de atenção.

Portanto, a grande questão passa a ser não se a mídia impressa vai morrer, mas como ela vem buscando alternativas para se manter atrativa perante as outras opções. Como a mídia impressa reage a esse cenário hipercompetitivo.

Mesmo desafio pelo qual a televisão e até os blogs vêm passando, ou seja, como conquistar a atenção. Destacar-se perante tantas opções.

No caso da mídia impressa, essa busca por mais atratividade envolve a absorção de novas tecnologias de impressão e a união entre comunicação verbal e não-verbal, além, claro, da noção de que a mídia impressa não detém mais o monopólio da atenção.

Parte dessa busca está condensada no livro “Encartes Especiais“, de Sergio Picciarelli Junior, da editora Abril e pesquisador da ECA/USP, lançado no final do mês passado.

Picciarelli trabalha há 18 anos na Editora Abril e, atualmente, é especialista na área de Desenvolvimento de Novos Produtos da editora. Seu livro é fruto de pesquisa aplicada. Ou seja, trabalho acadêmico visando resolver problemas e demandas reais do mercado.

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Basicamente, Picciarelli faz um passeio por todas essas novas tecnologias e abordagens utilizadas pela mídia impressa para enfrentar a disputa por atenção – uso de chips de som e luz, holografia, tintas fluorescentes, removíveis, termocrômicas (que mudam a cor de acordo com a temperatura), texturas, pop-ups, etiquetas com aromas, além de recursos que incentivam o manuseio (cordas e elásticos).

Tecnologias, que, por sinal, já são desenvolvidas há 10 anos por gráficas que vêm investindo em seus parques tecnológicos.

O nome “Encartes Especiais” vem do fato de que essas tecnologias são utilizadas, em sua maioria, em encartes publicitários inseridos em revistas. É aquele anúncio de desodorante que vem com uma etiqueta, que, quando você puxa, solta um aroma. Ou ainda, aquele anúncio de carro em que você é convidado a desarmar a dobra de uma página.

Ou mais ainda, aquela página que, quando você vira, ela emite um som, resultado da utilização de um chip de áudio embutido.

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O livro é repleto (cerca de 50) de estudos de casos nacionais de uso dessas tecnologias e abordagens (interativas). São diversas técnicas e abordagens feitas para chamar a atenção do leitor e melhorar a mensagem de um anúncio.

Além do desafio da escassez de atenção, o livro de Picciarelli aborda a questão da união da comunicação verbal e não-verbal, sobre o estímulo aos vários sentidos, ir além da racionalidade e das barreiras idiomáticas do texto. A mídia impressa é a única em que podemos mexer com os 5 sentidos.

Tudo isso é mostrado com o apoio de teorias. Pensadores do chamado Colégio Invisível, por exemplo, que observam a comunicação como um processo integrado, são citados diversas vezes para reforçar os exemplos mostrados. Não é apenas um livro técnico.

Em “Encartes Especiais“, a qualidade mais evidente é a minuciosa edição e encardenação. O livro ficou um tempo na minha mesa em meu home-office. Era o que mais chamava a atenção. Todo mundo que passava o folheava. A capa tem letras prateadas e é macia. Chama a atenção. Ou seja, o próprio livro de Picciarelli é um exemplo do que ele comenta na obra.

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Não é apenas para ler, não é somente comunicação escrita ou verbal, é também para manusear, cheirar, mexer. Trabalha com vários sentidos. Cerca de 20 exemplos reais com esses recursos de interatividade são mostrados, olfato (você puxa uma etiqueta em uma xícara de café e sente o cheiro da bebida), tato (você esfrega uma imagem e após algum tempo aparece outra), visão (quando você coloca a imagem contra o sol, aparecem outros detalhes).

Você imagina como está o livro enquanto escrevo esse post. Com cheiro de maçã, café, imagens raspadas e levemente amassado.

Durante a leitura/manuseio/interação de “Encartes Especiais“, algo que chamou a minha atenção é que 99% dos exemplos citados são voltados à área de publicidade, são anúncios. Apenas um exemplo é relacionado ao jornalismo.

Uma Revista Superinteressante de abril de 1997, em que a capa trouxe uma aplicação de aroma de banana, que servia de isca para chamar a atenção para uma reportagem interna sobre o funcionamento do olfato e a tecnologia do “nariz artificial“.

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Ou seja, a impressão que fica é que, ao contrário da publicidade, o jornalismo ainda não despertou para as possibilidades que essas novas tecnologias de impressão (ou não) proporcionam. Recentemente, temos visto algo ainda tímido envolvendo a tecnologia de “realidade aumentada“.

Da mesma forma que fizeram ou fazem as agências de publicidade, fiquei pensando sobre o quanto o jornalismo poderia se aproveitar dessa crescente “interatividade” da mídia impressa, de todas essas tecnologias de impressão.

De repente, um infográfico com texturas, o uso de um chip de som para complementar a apresentação de uma reportagem, holografia ou até o uso de aromas em alguma matéria sobre bebidas ou alimentos.

As possibilidades poderiam ser variadas. Abriria-se oportunidade para várias leituras em um ambiente onde a atenção é cada vez mais escassa. Enfim, seria possível aproveitar um dos mais criativos momentos da mídia impressa do ponto de vista de uso de novas tecnologias.

Momento em que justamente devido às novas opções, à competividade e à consequente busca por atenção, a mídia impressa se mexe para buscar novos horizontes com o leitor.

Veja também:
Livro aborda as “histórias escondidas nas buscas”

Crédito das fotos: Leslie e anúncios diferenciados

21 respostas para “Tecnologias para curar a escassez de atenção na mídia impressa”.

  1. Concordo contigo. E isso me faz lembrar que na época do meu curso na Fatec uma das discussões mais acaloradas era o fim do papel, uma vez que a informação podia ser guardada digitalmente. O que ficou mais implicito era que poderia diminuir o uso, mas nunca acaba, até porque novas técnicas sempre ficam dependentes das antigas. Construir algo novo sem pensar no passado e trabalhar com ele é impossível. Abraços

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  2. Muito interessante o assunto deste livro.

    Nos temos a ideia de que interatividade =digital, mas esta frase “A mídia impressa é a única em que podemos mexer com os 5 sentidos.” diz tudo.

    Esta é a verdadeira interatividade.

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    1. @Fabio

      Com certeza, Fabio.
      O livro do Picciarelli mostra muito bem esse diferencial e lado mais competitivo da mídia impressa.

      abs

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  3. Pessoal, estabelecer algum tipo de análise entre esses dois veículos de comunicação é assunto que nos reporta a variados links, mas comprei o livro do Picciarelli e é muito interessante. Quem tiver interesse segue o site para conhecimento ou compra do mesmo.
    http://www.anunciosdiferenciados.com.br
    Abs.

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  4. Olá. Tiago !

    Sensacional esse livro e o que nele você ratifica em seu texto. Meu pai trabalha no setor papaleiro ha mais de 50 anos e como disse aí um comentário, sobre a chegada das novas tecnologias em detrimento do futuro do papel ou ate mesmo seu fim em muitas midias. Ouço isso ha anos e meu pai sempre dizendo; O PAPEL SÓ VAI FAZER AUMENTAR A SUA PRODUÇÃO , e vejo que ele tinha mesmo razão. Isso fica bem claro com os exemplos de tantas possibilidades do papel que o senhor Sergio Piciarelli aponta em seu livro ENCARTES ESPECIAS”

    Obrigado,

    Frank Mora
    diretor de tv e documentarista

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  5. Eu recomendo o livro. Um material inédito no mercado. Até os meus filhoas adoraram as imagens e interagir com os efeitos propostos pelo autor.

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  6. Avatar de Davidson Correa
    Davidson Correa

    Colegas,

    A materia do colega Tiago Doria relata com detalhes o que se passa no belissimo livro encartes especiais de Picciarelli.
    Quem sabe nao temos o inicio de uma nova fase, onde esse recursos possam ser utilizados pelas redações e nao só pelas agencias de publicidade.

    O livro e uma verdadeira obra de arte. eu comprei e recomendo a todos

    abs
    Davidson

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  7. Avatar de Margareth Oliveira
    Margareth Oliveira

    O livro parece incrivel, completo e um verdadeiro mix de t’ecnica com a pratica. QUERO UM 🙂

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  8. […] Ou seja, já havia um senso de conversação e “interatividade” na mídia impressa. Isso em 1690. Imagina se na época eles tivessem lido o livro do Picciarelli. […]

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  9. Esse livro deve ser maravilhoso!

    Sou novo publicitário e muito atraido por criações relacionadas as novas possibilidades da industria gráfica.
    O Kindle pode vir a se popularizar no futuro mas existe uma grande oportunidade para quem quiser ter uma mensagem impressa e marcante até lá.

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  10. Avatar de Francisco Lucio Lima
    Francisco Lucio Lima

    É um livro que veio para suprir a falta de informações com relação a mídia diferenciada. É uma boa oportunidade para o mercado publicitário visualizar as muitas possibilidades de se aventurar em novas experiências.
    O livro vem ricamente ilustardo e está muito bem diagramado, bem facil de entender o que se passa por trás de anúncio bem feito.
    Parabéns Picciarelli.

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  13. A verdade é que os publicitários tem proposto diversas soluções para diversos problemas de hoje em dia.

    Em um mundo que só se fala de inovação, os caras viraram os principais autores das mudanças. Todos têm muito o que aprender com eles.

    Obs: Eu não sou publicitário.

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  14. […] “Encartes Especiais“, de Sergio Picciarelli Junior O livro mostra como a mídia impressa vem reagindo ao cenário hipercompetitivo e de escassez de atenção. Uma das respostas é o uso de novas tecnologias e técnicas de impressão – chips de som e luz, holografia, tintas fluorescentes, removíveis, termocrômicas. […]

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  15. […] Picciarelli, autor de Encartes Especiais e leitor deste blog, enviou por email mais uma experimentação feita com mídia impressa aqui, no […]

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  18. […] livro “Encartes Especiais“, o pesquisador brasileiro Sergio Picciarelli mostra como a mídia impressa no Brasil vem se […]

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  19. […] também: Tecnologias para curar a escassez de atenção na mídia impressa Enviar por […]

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  20. Esses artifícios impressos estão para a mídia de hoje como a poesia concreta nos anos 70 está para a poesia digital: são esboços tacanhos, uma sombra do que a tecnologia digital já faz. Basear um livro em 50 estudos sobre “encartes especiais” com a intenção de se aplicar ao mercado me parece uma tolice tão grande que não sei como a Abril e a USP se dedicaram a isso. Se fosse um livro de arquivo ou memória, tudo bem, tem seu valor. Mas este tipo de iniciativa mais parece placebo ou homeopatia para aplacar o medo do impresso sobre as tecnologias: não provê nada que realmente faça diferença, não apresenta novas ideias, nao descreve comportamentos ou ajuda a prever as expectativas do novo leitor.

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